sexta-feira, 12 de julho de 2013

                                                  
                                                 
                                                A melhor prenda



                                                       Capitulo III

                                                           A revolta


                              
                   

                       Como devem calcular tudo o que  tenho na minha vida foi conseguido com muito esforço. Foi uma batalha diária tentando viver neste mundo de gente “normal”.
A medida que o tempo passa fui aceitando melhor a minha condição de deficiente. Aceitando e ao mesmo tempo entendendo melhor o que isso significava. Aprendi a gostar dessa minha diferença. Quanto mais gostava de mim mais me revoltavam certas atitudes com que tive de lidar. Revoltei-me contra tudo e contra todos. Revoltei-me contra os falsos apoios e os falsos apoiantes. Revoltei-me contra a sociedade em geral.
                       Sei que corro o risco de ser mal interpretada.  Alguns não terão a capacidade de me entender, pois para isso teriam de ter passado pelas mesmas experiências. Contudo peço que não levem a mal estas palavras.. Não se trata de uma opinião generalizada. O que aqui escrevo não é fruto de nenhum inquérito ou investigação mais cuidada. Esta é apenas a minha opinião, o que sinto ou como me sinto.
                        Tentei sempre ser o mais normal possível, fazer tudo o que os outros fazem independentemente do esforço que isso implicava. Depois de tanto esforço a tentar  igualar-me, a última coisa que me apetece é que estejam constantemente a lembrar-me que sou deficiente. Já o sei! Podem crer. Mas, isso é algo que luto para esquecer, e esqueço facilmente….mas sempre que passo por um espelho, sempre que o sol brilha e a minha sombra se reflecte no chão …não da para continuar a fingir. A prova ta ali aos meus pés mexendo-se aos meus movimentos e lembrando-me…”NÃO FINJAS! ESTA  ÈS TU!  Como se não bastassem estas evidencias das quais não posso fugir , ainda tenho de lidar com as atenções exageradas da sociedade que mais não servem do que para reforçar ainda mais a minha condição de “diferente” de necessitada.
                     Não pensem com isto que não aceito os meus defeitos.  Sei exactamente o que sou  e gosto de mim apesar de tudo. A prova de que me aceito ficará registada aqui neste testemunho.
Costumo dizer que os complexados não somos nós os “diferentes “ . Os complexados são aqueles que têm medo de usar a palavra deficiente. São aqueles que nos rodeiam, aqueles que dizem não ser racistas .aqueles que se dizem sem preconceitos.  Ninguém é racista ou perconceituoso até ao dia em que a filha entrar em casa de mão dada com um preto e disser “este é o meu namorado”. Aceitamos tudo. Pretos deficientes homossexuais… tudo. Desde que não venham manchar a família perfeita que temos. Hipocrisias. O mundo ta cheio delas. Não é de forma nenhuma uma critica. Eu  não sou melhor que ninguém e sei ser hipócrita quando isso me beneficia. Pensamos sempre primeiro no nosso umbigo e não vale a pena dizer que não.  Pois no meu caso também não há preconceitos. Não senhor. Isso seria uma grande maldade e nós somos todos muito caridosos.  Tão caridosos que nos olham de cima a baixo com aquele ar de pena  … ou aqueles que nos olham como se fossemos bicho raro e disfarçam atabalhoadamente quando os apanhamos em flagrante. Olhem a vontade! Então agora é proibido olhar? Mas pior de tudo são aqueles que insistem em nos ajudar. Aqueles que querem forçosamente conseguir praticar a sua boa acção do dia as nossas custas.Aqueles que insistem ajudar-nos a levantar da cadeira, os que nos querem transportar o saco das compras, os que nos querem ajudar a subir o autocarro e nos empurram quase nos atirando para cima do motorista a força…Que fique registado que cada situação foi vivida e sentida por mim. Não posso nem quero que isto seja visto como uma cópia do que um deficiente sente. Isto são as minhas experiências e cada um se identificará com elas ou não... conheço alguns como eu que se ergueram e foram a luta mas, também conheço os que insistem em viver na condição de coitadinhos e são felizes assim. Quem me conhece sabe que jamais tive atitude derrotista para com a vida.Voltando ao tema:Serei eu a complexada por recusar ajuda? Ou são os que acham que só pelo facto de sermos deficientes precisamos forçosamente de ajuda? Em muitas coisas somos muito mais capazes e para termos os meus direitos, temos de o provar dia a dia.
 Pensem bem nisto!
              Pequenos exemplos: se me sento é porque me consigo levantar sozinha. Se ando de autocarro é porque sou perfeitamente capaz de entrar e sair dele. Se transporto as minhas compras é porque o peso esta adequado ao que  posso suportar. Conseguem entender isto? Nunca pude caminhar com a minha filha ao colo e por isso sempre que tinha de a transportar de um lado para o outro pedia ajuda. Mas não premitia que ningeum mudasse a fralda ou alimentasse ou desse banho... entendem essa diferença de pedir ajuda ou limitarem ainda mais nossas capacidades?
                          Depois de tudo isto muitos estão a pensar que INGRATA!
Não sou mal agradecida, Acreditem! Já precisei e já usei tantas vezes a vossa ajuda. O que pretendo deixar aqui registado é que  por vezes na tentativa de ajudar acabamos por prejudicar mais. Sei exactamente quais são as minhas limitações  e não duvidem que quando não posso ou minhas forças falham eu não me envergonho de o dizer.. e, nestes casos agradeço a todos aqueles que estão lá.... (continua) 

2 comentários:

  1. Nunca te vi dessa forma, mas sempre te vi com admiração! Lembro-me, por exemplo, de me contares que aspiravas a casa e eu ficar a pensar como conseguias, lembro-me de te ver subir para o autocarro e eu ficar por segundos gelada com medo de que caísses ;)
    Beijinhos

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    1. acredito no teu receio e nessa admiração amiga... é normal:) e nuca me viste assim porque eu não deixava que me vissem assim. quanto a fazer tudo em casa ... agradeço a minha mãe que mesmo não tendo estudos nem muita cultura,acabou por fazer comigo um bom trabalho ....mais tarde falarei disso...

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