quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Agradeço a todos os que me tratam de igual para igual e não me falham quando digo “ não posso fazer isso”  respondendo “podes porque eu vou ajudar-te”. A estes eu agradeço do fundo do coração. Amigos e todos aqueles que mesmo não conhecendo passam pelo mundo atentos aos pedidos de ajuda e se disponibilizam para isso. Agora não me peçam para agradecer aqueles que nos  vêm como uma coitadinhos e insistem em levar nos ao colo. Humilhante! Choca meus amigos? Era bom que isso acontecesse e esta sociedade fizesse alguma coisa. Ponham -se no lugar de um deficiente em cadeira de rodas..perguntem-se se é melhor ser carregado ao colo pela família ou amigos para subir escadas , deslocar se a praia etc... ou se o ideal seria ter os devidos acessos para que o possa fazer com o mínimo de dignidade como qualquer outra pessoa.
            Não critico aqueles que perguntam : O que lhe aconteceu? Mas, critico aqueles que olham e olham e olham…e de repente desviam o olhar disfarçando atabalhoadamente quando o nosso se cruza com o deles. Olhem a vontade!Afinal de contas a diferença existe e é normal que desperte a curiosidade.Vocês entendem a diferença? Só quero que percebam o que realmente nos incomoda.
           Não me incomoda a criança que me vê e pergunta a mãe “o que é que a senhora tem?”, mas incomoda-me a mãe que a repreende em voz baixa para eu não ouvir e que quase a esbofeteia se ela insiste em querer saber porque … porque … porque …
O que podemos esperar desta criança quando for adulta? Que aceite os deficientes como parte da sociedade ? Não me parece que este seja o caminho para educarmos os nossos filhos para a igualdade.
         Falamos tanto de integração dos deficientes . Mas integração em que?  Estão a fazer um favor ao nos dar trabalho?  Não seremos nos capazes de trabalhar tão bem ou melhor que qualquer outra pessoa? Não podemos fazer tudo. Pois não. Cada individuo procura fazer o que esta de acordo com as suas capacidades. Não funciona assim com toda a gente? Se tens problemas de coluna vais trabalhar para as obras?Ou procuras um trabalho que possas fazer?
          No nosso caso parece que não é assim...Não temos um simples problema de coluna amigos, logo, somos incapazes e ponto.Temos que nos esforçar muito mais para conseguir um trabalho e por vezes este só aparece, porque as empresas estão de olho nos subsídios,que o estado dá de incentivo para que se empreguem os  coitadinhos. Mais uma humilhação.Estamos ali e ganhamos o nosso ordenado bem merecido e por mérito próprio, mas nunca deixamos de nos sentir  agradecidos pelo grande favor que nos fizeram em nos dar emprego. Eu Felizmente sou um dos poucos casos com trabalho e sem esse beneficio...Obrigada aqueles que me empregaram sem medo da diferença e sem pedir ou esperar compensações, a não ser as que vem do meu trabalho.
             Que sociedade esta! Tenho eu 37 anos 34 dos quais vividos na condição de deficiente e ainda hoje não consigo deixar de me surpreender com as supostas regalias que  temos. Para aqueles que ainda acreditam que elas são reais,vou deixar aqui algumas passagens da minha vida, em jeito de anedota, porque na realidade alguns benefícios não passam disso mesmo. Anedotas!
                Um dia destes desloco-me como tantas vezes o faço a uma grande superficie na zona onde habito.Chegando ao local verifico que o parque de estacionamento tem local próprio para deficientes senhoras grávidas  e acompanhantes de crianças de colo. Até aqui tudo muito louvável e semelhante a tantos outros locais pelo pais. Não estava no meu carro habitual e não era eu a condutora mas sendo deficiente estacionamos no local que me estava destinado. Ao sair do carro sou abordada por um segurança que me pede para colocar o dístico de deficiente. Explico então que o carro não é meu e não tenho ali o comprovativo de deficiência, mas o senhor esta a ver-me e portanto não há duvida que sou deficiente. O segurança,mesmo perante a evidência insiste que não  posso estacionar ali. Sei as regras de transito e como é óbvio não estacionaria naquele local se não estivesse num parque privado. Será que aquele senhor precisava que eu colasse um cartaz na testa a dizer “sou deficiente”? Já irritada perguntei-lhe como se identificaram as pessoas que estacionaram no local destinado as grávidas e as crianças de colo.Não vi atestado. Foi pelo tamanho avançado ou não das suas barrigas? Qual foi o critério que usou? Não obtive resposta  pelo que presumi que aquele segurança olhou e viu que estavam grávidas mas olhando para mim de muletas não conseguia ver que era deficiente. Sem mais discussões retiramos o carro do lugar de deficiente e estacionamos precisamente no lugar para as senhoras grávidas. Se aquele senhor tinha duvidas que me pedisse uma ecografia...Gravida não estava mas parece que o carro finalmente ficou bem estacionado.  Apesar de indignada naquele dia não apresentei reclamação .
Qual não é o meu espanto quando dias mais tarde volto ao mesmo local, desta vez  já no meu carro, e vejo no parque para deficientes um cadeado a impedir o acesso e um cartaz que diz: “se deseja estacionar neste local por favor dirija-se ao balcão de informações”.  Fico um tempo parada a olhar para aquilo incrédula com o absurdo que leio. Então o que é suposto fazer agora? Vou procurar um lugar para estacionar seja lá onde for,saio do carro de muletas, atravesso o parque de estacionamento, atravesso metade do shoping e chego finalmente ao balcão de informações. Estou 10 minutos em pé a espera da minha vez para ser atendida e mais 10 minutos a espera que chegue o segurança, que a menina chamou pelo intercomunicador e que supostamente  tem a chave  que abre o cadeado . Depois disto, há que iniciar o percurso de regresso ao carro,retirar do estacionamento e estacionar no lugarzinho para deficientes religiosamente guardado. E a saída não esquecer de passar primeiro no balcão de informações para o segurança vir de novo retirar o cadeado porque se me esqueço tenho de voltar para trás  Ora eu fiz isto de muletas agora imaginem o que seria se estivesse numa cadeira de rodas as vezes que teria de entrar e sair da cadeira e o incomodo de pedir que me tirem e guardem a cadeira na bagageira se não tiver elevador. Mas alguém tem a noção do que é ser deficiente? Alguém pára para pensar quando se lembra de fazer uma coisa destas ou criar um "beneficio"? Desta vez decidi mesmo apresentar a minha reclamação e dias depois provavelmente devido a minha e outras reclamações, o cadeado foi retirado.
               Volto a lembrar, antes de ajudar certifiquem se que sabem o que estão a fazer  ou será melhor nada fazer. Destes episódios tenho vários ao longo de toda a vida.
             Certo dia, tinha uma consulta  marcada e com a devida antecedência apresento-me na recepção do hospital,coloco-me na fila das consultas aguardando a minha vez. Uma funcionária do hospital, muito atenciosa, dirige-se a mim e diz-me “venha comigo a senhora tem prioridade”. Agradeço a amabilidade e ela entrega o meu cartão a colega da fila do lado que supostamente me atenderia mais rápido. Manda-me sentar mas eu já habituada a estas "ajudas", achei melhor aguardar em pé para não ficar esquecida. Assim vai notar a minha presença, pensei eu. Vou vendo o cartão pousado em cima da secretária e a funcionária atendendo outras pessoas sem sequer olhar para ele. Entretanto a fila do lado onde eu estava anteriormente continuava a avançar e  alem de já ter chegado a minha vez já tinham passado 5 pessoas a minha frente. Resultado, a consulta iria ser mais tarde, do que se tivesse permanecido na fila em que estava. Começo a ficar impaciente mas afinal que raio de prioridade é esta? Tenho que falar. Explico então a senhora que já podia ter sido atendida, que já me atrasou a consulta e que afinal estou a mais tempo em pé do que estaria no outro lado. “Eu disse a senhora que se sentasse” responde ela. Ora. chego então a conclusão, que a minha prioridade não estava no ser atendida mais rápido mas sim o poder esperar sentada até que a senhora se lembrasse do meu cartão.Se calhar ainda lá estava agora a espera da consulta mas sentadinha confortavelmente na cadeira de madeira…

                      Por estes e por outros incidentes é que raramente exerço esse suposto direito de prioridade  e quem verdadeiramente me conhece sabe disso.  Na tentativa de nos ajudar acabamos por sair prejudicados. As pessoas não sabem o que fazer para realmente ajudar e esta educação para a diferença cabe a todos nós enquanto elementos da mesma sociedade...(continua)

2 comentários:

  1. Essa do cadeado no lugar de estacionamento é mesmo uma anedota, só pode! Quem terá sido a inteligência a ter essa ideia?
    Aqui há tempos tive de levar a minha mãe a uma consulta e vi-me "grega" para entrar com ela de cadeira de rodas dentro do prédio e até no elevador. E olha que a cadeira dela não é das maiores!
    Beijinhos, bom domingo!

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    1. minha amiga pois esta pratica do cadeado é muito comum ...kkk pode passar despercebida aos que nao usam estes lugares, mas quem percisa ja viu disto :)

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